terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Mark Knopfler, o "errado" que deu certo - Parte 1

[Errado, eu? Quem disse?]
Com essa frase controversa, vou começar esse blog falando da minha maior influência nas 6 cordas. O genial Mark Knopfler.

-Ah, lá vem mais um falar aquele blá-blá-blá do Dire Straits/Mark Knopfler, de tocar com os dedos ao invés da palheta, de que a banda estava na contramão da época, essas coisas. NÃO, não vou falar sobre isso exatamente rsrsrsrs.

Me lembro de escutar 'valendo' os Straits pela primeira vez... Estava numa viagem de carro quando um amigo colocou a coletânea 'Money For Nothing'. Assim que cada música tocava, me lembrava de ouvi-las quando criança e que conhecia praticamente todas elas, só não sabia que eram da mesma banda. Aquilo ficou na minha cabeça, estava começando a tocar e coloquei como 'a meta': Tenho que tocar Sultans of Swing!
E a partir daquele instante, a musica do Dire Straits/Mark Knopfler nunca mais saiu da minha vida.

Após anos ouvindo (devorando) seus discos, algo que me chamou a atenção foi a versatilidade das suas composições. De puro Rock n' Roll ao Bolero, do Country ao Tango, do Blues ao Celta... Enfim, o homem naquele instante, virava gênio.
Guitarristicamente falando, um gênio a sua maneira. Digo isso pois a sua maneira de tocar se encaixa em qualquer estilo. Afirmo também que sua maneira de tocar é o elo entre quase todos os estilos musicais ocidentais (Já já chego nessa parte).

Porém, essa maneira de tocar tão particular desenvolveu uma certa repulsa a estilos (ou artistas) que não remetessem às suas próprias músicas, causando assim performances horríveis (talvez desalinhadas) dele ao lado de outros artistas. Clapton que o diga (Chego lá mais tarde).


Início:

A maioria das pessoas sabem que Mark Knopfler nasceu na Escócia, se mudou muito cedo para a Inglaterra, trampou como jornalista, ouvia muito Country, Blues, Shadows e Elvis... até que um belo dia,  tocando num violão Gibson, trocou a palheta pelos dedos e a mágica aconteceu. O homem em pessoa, anos depois conta mais ou menos como foi essa história da transição da palheta para o fingerstyle. Reparem na 'baixaria' com o polegar, notem que ele toca um monte de estilos e a execução da mão direita "parece" sempre a mesma.

[O homem contando como foi essa história]
Assim como todo mundo que deu certo na música, O processo de tentativa e erro do Dire Straits/Mark Knopfler foi grande. Seu maior sucesso, Sultans of Swing, deve ter tido umas 4 versões antes de entrar no disco. 
Demo pra lá, demo pra cá, tanto o guitarrista como a banda (que possui 99,9% as músicas lançadas de autoria do MK) foram amadurecendo até que saiu o primeiro disco, intitulado de 'Dire Straits'


Chega de historinhas e vamos falar de guitarra!

[Dire Straits]
Em resumo, o disco reúne excelentes canções numa vibe Folk, Dub, Country, Blues... com uma timbragem única. Baterias de pele porosa, baixos Fender Precision Bass e de guitarras, Basicamente um Dobro National, um Martin DC-18, Fender Stratocaster, Gibson Les Paul Junior Double Cutway e amplificadores Fender Tremolux. Tem um teclado muito discreto e uma percussão aqui e alí também. Devem haver mais algumas coisas naquela gravação, isso porque nunca se sabe o que o estúdio em sí pode prover.


Guitarras Arthur! vamos falar de guitarras....


Não é bem assim não, toda a ambientação do disco é um prato cheio para as peripécias guitarrísticas de Mark Knopfler, assim como seu timbre, que consiste basicamente de uma Stratocaster com a chave de 5 na posição 2(ponte e meio) ligada num bom ampli de som limpo com um ótimo reverb e um pedal de volume. Nada complexo. Inclusive, em turnê, ele fazia 90% do Show com uma única Fender Strato.

Ah, mas ele toca limpo....

Sim, claro! 
Ainda mais quando os Marshall Plexi estavam em alta e haviam pedais violentos como o Colorsound, o Big Muff PI ou até mesmo o Fuzzface. 
Hendrix já estava no céu, Clapton já havia deixado o Cream e as Gibsons, Gilmour já havia gravado o Dark Side e as bandas de punk dominavam o cenário Londrino.Em resumo, drive era boia!
Então, o Sr. Knopfler quebrou o paradigma da época e veio com aquele som, que não era nenhuma novidade pra ele.

Ah, para com isso...
 
Que nada, essa história de 'tocar limpo' vem de longe. BB King, Jimmy Bryant, Elmore James, Scotty Moore, James Burton, Hank Marvin entre outros usavam suas guitarras plugadas direto em amplificadores (muitas vezes com um echo) em que o 'drive' vinha apenas da saturação do ampli, logicamente usados no máximo. E não era beeeem um drive não, era apenas aquele fim de nota levemente distorcido (Puta timbre lindo).

Então, O que o MK fez não foi diferente de ninguém. Ele usou a linguagem de seus guitarristas favoritos para benefício próprio, criando naturalmente, seu estilo inconfundível de tocar.
Provavelmente, o MK devia ser um cara "preguiçoso", digo isso porque acho que ele nunca 'pegou' um solo nota por nota na vida. Deve ser por isso que a maioria dos licks tem sua assinatura.


Vamos ao assunto guitarrístico...

Pra quem teve paciência de ler todo esse vai e vem dessa história, e for ouvir o disco, vai entender exatamente o que estou falando. Músicas boas, boa timbragem, lances de pergunta e resposta típicos de blues e tudo aquilo que falei ali em cima.

Tecnicamente, 80% das guitarras que se ouve no disco foram gravadas pelo Mark, cabendo ao seu irmão e guitarrista base David as bases mais simples(Não vejo ele como um guitarrista "ruim", acho que ele tinha síndrome da luz vermelha). Sendo assim tanto a parte rítmica quanto solo ficaram nas nas mãos do 'ainda não ícone' Mark Knopfler.

Pra quem quer entender o que eu digo, sei que muita gente deve ter ouvido, mas aí vai o take de guitarra/voz do Sr. Knopfler da famigerada Sultans of Swing.

[SOS - Guitarra/Vocal]
"Pois é, não são só solos que fazem um guitarrista."

Em termos técnicos, aí estão uma Fender Stratocaster com escala em maple, várias combinações entre os captadores (um deles, provavelmente o do meio, era um Dimarzio FST com um ganho maior, por isso os sons "in between" são um pouco diferentes). Tudo isso plugado num Fender Tremolux e um Roland jazz Chorus por traz.


As músicas mais 'guitarrísticas' do disco são sem dúvida:
- Sultans of Swing
- Down To The Waterline
- In The Gallery (essa música é subestimadíssima)

Mas também há excelentes licks e frases em canções como:
- Six Blade Knife
- Southbound Again
- Setting Me Up (essa aí tocada num Gibson Junior DC)

[Dire Straits - 1º álbum]
1- Down To The Waterline
2- Water Of Love
3- Setting Me Up
4- Six Blade Knife
5- Sultans Of Swing
6- Wild West End
7- In The Gallery
8- Lions

Gtr/Voc - Mark Knopfler
Gtr/Tec/Bvoc - David Knopfler
Bx/Bvoc - John Illsley
Btr/Bvoc - Pick Witherns


Pronto! Depois desse disco a banda deslanchou, O Sr. Knopfler já estava no panteão dos grandes, era o "errado" que deu certo. "Errado" com um fraseado e timbre ao avesso do que se fazia na época. Django havia renascido, Caipira, mas renascido.



Parceria com Dylan...

Todo mundo, ou boa parte, sabem que uma das principais influências do Sr. Knopfler sempre foi Bob Dylan. Pois então, o homem em questão convidou Mark e Pick para tocarem no seu disco novo, o gospel 'Slow Train Comming'. Para Knopfler, foi um prato cheio, pois ainda não havia saído de sua zona de conforto e ainda estava com seu baterista favorito para as sessões com o Sr. Dylan.
Nesse disco aparece mais uma faceta de Mark Knopfler, a influência quase desconhecida de Albert King.

Como é?

Isso mesmo, vai dizer que você que toca guitarra nunca pegou alguma coisa de um guitarrista sem muito a ver com você? Esse foi o caso, sempre que MK era convidado a tocar com alguém, ele sempre vinha com algo à la Albert King. Talvez por já saber que seu estilo não iria encaixar 100% com outro artista.

Bom, aí vai um pouco de Mark 'King' Knopfler
(infelizmente, não consegui anexar o vídeo aqui)

Notem o timbre típico dos Straits porém com bends longos e muito sustain. Assim como na parceria com Buddy Guy em 'Where Is the Next One Comming From' do disco 'Damn, Right, I Got The Blues'





2º Disco e a 'mesmice'


Em 1979 veio o 2º disco da banda. O álbum intitulado 'Communiqué' soa como uma continuação do disco anterior, Pra quem gostou do 'boom' do primeiro disco, essa sequencia tem basicamente a mesma linguagem, porém sem a atmosfera despojada do 1º disco, um disco gravado com cuidado, mais técnico e limpo. 

[Communiqué] 
Esse disco foi bastante subestimado, talvez pelas canções as vezes sonolentas, outrora por ser uma espécie de repetição do disco anterior.
O álbum mostra também um certo cansaço, mesmo com as ótimas 'Once Upon A Time In The West',
'Single Handed Saylor' e 'Lady Writer'.

No set de instrumentos, outras guitarras começaram a fazer parte do arsenal, como mais algumas Telecasters e uma Burns Baldwin 12 cordas. Porém a banda (diga-se Mark Knopfler) estava numa posição inquietante e iminente para uma mudança de direção. Essas mudançar iriam refletir no seu estilo de tocar. A partir dessa turnê, a mudança das composições e consequentemente a maneira de tocar do Sr. Knopfler começa a mudar drasticamente. 
Novos timbres e frases, novas guitarras e a adição de alguma complexidade ao seu som.


[Communiqué - 2º álbum]















SETLIST:
1- Once Upon A Time In The West
2- News
3- Where Do You Think You're Going
4- Communiqué
5- Lady Writer
6- Angel of Mercy
7- Potobello belle
8- Single Handed Saylor
9- Follow Me Home

Gtr/Voc - Mark Knopfler
Gtr/Bvoc - David Knopfler
Bx/Bvoc - John Illsley
Btr/Bvoc - Pick Witherns



Eu e meus devaneios... Guitarras, ora bolas!


Ok, ok... Guitarristicamente falando, não mudou muita coisa. Novamente, as harmonias e climas das músicas são um prato cheio para as execuções do Sr. Knopfler. Com certeza, o timbre de guitarra desse disco está melhor, mais definido. (com certeza, havia mais dinheiro pra gravar também). A essência to timbre ainda é o mesmo, Fender Stratocaster e som limpo. Porém, mesmo com verba,as músicas não possuem a performance do disco anterior, os solos não tem tantas notas, mas que não deixam de ser maravilhosos. (Menos é sempre mais)

As três músicas citadas acima ('Once Upon A Time In The West',
'Single Handed Saylor' e 'Lady Writer') possuem um arsenal de licks e solos de tirar o chapéu.


Não vou me estender muito na fase desse disco, pois existia uma lado pessoal agregado ao sentimento de todo esse disco. Quem tiver interesse, exijo que visitem o blog do meu camarada Brunno Nunes, pra mim o maior entendedor de Dire Straits/Mark Knopfler do mercado:


A parir de 1980, Mark Knopfler, tanto como guitarrista ou compositor, inicia uma mudança severa no seu estilo. Começa então um aperfeiçoamento timbrístico e lírico em suas obras. Coisas que vou falar na Parte 2 desse que é o meu Guitar Hero nº1.


Nesse ano também chega ao fim da linha sua guitarra principal, uma Fender Stratocaster Fake. Provavelmente um corpo japonês com um braço de maple Fender.


Pra finalizar, um concerto que representa a primeira fase guitarrística do Sr. Knopfler. Aí estão a Fender Fake, amplificadores Music Man, pedal de volume, compressor e delay. Prestem bem a atenção no polegar da mão direita, ghosts notes, bouble bends e tudo que o Sr. Knopfler tem a oferecer nesse vídeo.

 [Mark em ação na íntegra com sua Fender Fake]


Guitarras Fake ou não, o timbre vem dos dedos. Ele achou o 'seu som' e cagou pro resto.

Palavras do mestre John Suhr sobre Mark e sua Strato "vagabunda":
"Mark told me at the time when I met him in the early 80s that that was the original guitar (Maple neck) that he had used, I assume Sultans era.
The Body wasn't a Fender and the neck was a fingerboard maple neck that looked sketchy, it had been planed so flat it was terrible so we put a Schecter neck on it.
The whole guitar was a basket case. My memory could be failing but that is what I remember (pretty clearly).
Basically Mark could pick up the most unplayable guitar in the shop but it never mattered, he always could play it and get his tone."




Obrigado pela paciência e até a parte 2!

12 comentários:

  1. Arthur, saudações.
    Parabéns pelo blog. O achei muito interessante.
    Faço apenas uma observação. Se puderes, acredito que seria interessante alterares o seu blog para que pudesse ser visualizado por Ipads (e gadgets do gênero). Não consigo ver algumas figuras (acho que são figuras) e vídeos (estou usando um Ipad).
    Gostaria de continuar lendo os seus posts, visto que escreves muito bem, e por me interessar por tudo que se relaciona com a guitarra.
    Grande abraço e, mais uma vez, parabéns pela iniciativa.
    Rafael Higashi
    PS: Descobri seu blog lendo o blog do Paulo May (Loucoguitarra).

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    1. Olá Rafael.
      Obrigado pelas palavras e sugestões. Ainda sou 'menino' aqui e estou procurando como fazer pra que funcione legal em Ipads. Logo logo estará tudo ok, eu acho.

      Seja muito bem vindo e mais uma vez, obrigado pelas palavras.


      abs,
      Arthur

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  2. OI Arthur, sou fan de Mark Knopfler e dos Dire Straits tmb.Conheço o blog do nosso camarada Brunno Nunes e adoro ler e curtir as historias da melhor banda de rock (sem desmerecer as demais).

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    1. Valeu pela presença aqui, Roberto. Logo mais devo estar falando um pouco mais sobre o nosso maestro. Abraço

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Mark sempre será o Pele; e o Slash sempre será o Maradona, o velho Mark o eterno rei dos solos memoráveis!

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    1. Com certeza, Geraldo.
      Mark é nosso Pelé!

      Obrigado pela passagem.
      Abração

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Tendo Mark Knopfler e Dire Straits como o melhor (que gosto mais) guitarrista e banda de todos os tempos, respectivamente, agradeço pela sua grande contribuição sobre o assunto!

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  7. Deus no céu, MK(com sua guitarra)na terra

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  8. Knopfler e o paradoxo do que bom que a guitarra pode com o muito bom que o Knopfler pode com a guitarra e o tesla das seis cordas ritmicas !

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